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sábado, 18 de junho de 2011

PostHeaderIcon Quadrilhas juninas estilizadas e tradicionais diminuem progressivamente por falta de apoio cultural

Rio  Grande do Norte - Há quem critique a autenticidade da tradição cultural das quadrilhas juninas. Aos brincantes, o fato pouco importa. Acreditam no que fazem, olham de soslaio para as discussões e trabalham o ano inteiro com uma dedicação que beira a ideologia. Dispensam tempo, dinheiro e às vezes largam até relacionamentos para continuar na atividade, junto à "família junina". No Rio Grande do Norte, essa "família" tem diminuído a cada ano. A escassez das festas juninas nos bairros é apenas um retrato do problema.



Em 1988, haviam mais de 400 grupos em Natal. Este ano número chega a apenas 57 Foto: Arquivo DB/D.A Press
Décadas atrás, não havia chuva que apagasse a quantidade de fogueiras espalhadas pela cidade. Bandeirinhas, balões, fogos, milho assado... Ou quem não lembra do Arraiá da Esmeralda ou Arraia da Veia Chica? Esse "chá de sumiço" também ocorre nos galpões onde quadrilhas estilizadas ou tradicionais ensaiam. Em 1988 o número de quadrilhas espelhadas pela cidade ultrapassava 400. Ano passado foram 64. E hoje se resumem a 57 grupos. Os dados são da Liga Independente de Quadrilhas Juninas do Rio Grande do Norte.

A causa apontada para a queda é a falta de apoio do poder público. "Quem mais incentivou foi a professora Wilma de Faria, no mandato de prefeita. Depois, só veio a cair", constata Humberto Floriano, presidente da Liga há 15 anos,. Das 120 quadrilhas juninas filiadas à Liga, 57 são de Natal e o resto, do interior. A maioria é de quadrilha tradicional. Apenas 45 são estilizadas. A diferença se dá pelos custos mais elevados.


"As estilizadas representam o avanço na cultura popular dos festejos juninos. As tradicionais guardam mais as velhas tradições. Cada uma exerce bem o seu papel", opina. Ambas receberam verbas governamentais este ano. A Fundação José Augusto abriu edital de R$ 500 mil, sendo R$ 250 mil para o interior e outra metade para Natal. A Funcarte disponibilizou R$ 154 mil em convênio com a Liga. "A prefeitura fez tudo certo. Minha preocupação é a falta de fiscalização na distribuição do dinheiro pela FJA".

Dessa quantia, a Liga abstrai 5% para manutenção da sede. É a únicaverba recebida durante o ano. "Não podemos cobrar mensalidade dos grupos filiados. Eles mesmos já tiram do próprio bolso para se sustentarem. É uma situação difícil a que vivemos", lamenta. Humberto defende há anos melhor atenção à categoria. "Vamos sediar a Copa durante o período junino. Seria importante Natal vender melhor sua cultura e apostar nas quadrilhas". E cita ainda o trabalho realizado no carnaval e nos cortejos do Natal em Natal. "Somos nós quem confeccionamos aqueles figurinos todos", se orgulha.

Dedicação

João foi um santo austero. Mas as comemorações em torno de sua imagem, no mês de seu nascimento, sempre foram marcadas pela alegria dionisíaca, repletas de música, comida, danças, manifestações populares, fogueiras e até adivinhações para casamento. No Brasil, a tradição foi trazida pelos portugueses. Quem faz o registro é Câmara Cascudo, no Dicionário do Folclore Brasileiro. 

E a tradição ganhou luxo, estilo, adereços, figurinos diferenciados - quase alegorias carnavalescas. E para manter o padrão, as quadrilhas estilizadas gastam em torno de R$ 45 mil ao ano. A quantia representa mais ou menos o triplo ou dobro das tradicionais. A verba vem de patrocínios, apresentações em festas de pequeno e médio porte, aluguel de roupas para quadrilhas de menor projeção e mensalidade, em média, de R$ 200 de cada um dos 100 a 120 componentes do grupo.

Se nas quadrilhas tradicionais a função do marcador dita os passos dos pares com os famosos alavantu, anarriê, etc., nas estilizadas ele funciona quase como apresentador. A coreografia já está montada dentro de um tema escolhido, a exemplo das escolas de samba. O primeiro minuto de apresentação é quase uma leitura de texto referente à temática. A desse ano do Arraiá Balão Dourado se chama É Balão, e vai estar centrada neste que é o adereço mais tradicional dos festejos juninos.

A Balão Dourado é a segunda quadrilha mais antiga de Natal entre as estilizadas. Foi fundada há 15 anos. A sede é no conjunto Pajuçara. A maioria das quadrilhas de Natal estão concentradasna Zona Norte. Desde o início foi assim. A rotina do grupo é praticamente a mesma de outras quadrilhas de ponta de Natal: viagens, concursos e apresentações nos meses de junho e julho, montagem de peças, temáticas e logísticas até novembro, e reinício dos ensaios em janeiro.

"Quando terminamos o período junino, já temos a temática e figurino desenhado do ano seguinte definidos. Nos reunimos para discutir mudanças na diretoria, para apresentar as definições aos componentes e tentar manter a unidade do grupo", explica o diretor André Dantas de Azevedo, 27. E acrescenta: "É mais do que um compromisso de cada um. Só participa quem tem amor por fazer São João".

De fato. Os ensaios ocorrem em todos os fins de semana, sábado e domingo. De janeiro a maio, quando se intensificam ainda mais. "Quadrilhas do interior levam vantagem. Geralmente eles têm local mais espaçoso e próprio. Aqui, o trabalho profissional dos componentes dificulta uma melhor disponibilidade de tempo. No interior tudo é mais perto", aponta André.Vida junina

André de Azevedo dedicou mais da metade da vida à atividade de fazer São João. Foi componente da Balão Dourado e hoje é marcador, diretor e costureiro. A função é remunerada em outras escolas. Mas ele não cobra. "Faço porque gosto. Nos últimos dias tenho dormido entre três e quatro horas. Passo o dia na costura". A estreia do grupo seria no dia seguinte, em festivais de Cruzeta e Currais Novos. "No RN inteiro há competição nesse período". 

As quadrilhas juninas escolhem os concursos mais vantajosos. Os critérios são a distância e os prêmios, que variam entre R$ 1 mil e R$ 15 mil (em Mossoró) ao vencedor. A Balão Dourado termina o período com 25 apresentações. Em alguns festivais no interior chegam a viajar duas vezes, quando são classificados às finais. E tudo é custo. "Manter uma quadrilha custa caro. Só os vestidos custam R$ 70, cada".

André está desempregado. Até pouco trabalhava como assistente administrativo. E a namorada entende a dedicação. "Nos conhecemos na quadrilha. Quando não é assim,complica. Muitos acabaram relacionamentos por causa disso. É a família junina, uma só família". 
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